Você sabia que 30 de janeiro é dia de celebrar o quadrinho nacional? A data relembra a primeira publicação no Brasil nesse estilo que traz uma forma dinâmica de contar histórias.
Como boa parte das publicações deixou de circular há algum tempo, a impressão que dá é de que a trajetória é recente. No entanto, ela começou antes mesmo da Proclamação da República.
A princípio, as histórias eram baseadas no estilo satírico dos cartuns, charges e caricaturas. Nas tiras dos jornais e revistas, a linguagem se estabeleceu. Depois, vieram as histórias para crianças.
Atualmente, essa forma de arte tem um público adulto fiel e tem o valor literário amplamente reconhecido. A seguir, acompanhe brevemente em nossa linha do tempo o que ocorreu em mais de 150 anos.
Angelo Agostini e o primeiro quadrinho nacional
Em 30 de janeiro de 1869, Nhô Quim ou Impressões de uma Viagem à Corte retratava caipiras que acabavam de chegar à cidade.
Eles viviam em um mundo que crescia em torno da corte, mas ainda conviviam com as entidades da mitologia rural do Brasil.
O autor dessa história é Angelo Agostini, cronista italiano que vivia no Brasil há uma década. Como artista, ele buscava um realismo maior do que as caricaturas. Por isso, seu estilo é bem diferente dos chargistas da época.
Inicialmente, ele desenhava situações do cotidiano e fazia sátiras à Guerra do Paraguai. Esses desenhos eram publicados na revista Vida Fluminense.
Em 1876, Agostini fundou a Revista Ilustrada, a primeira do Império a ter autonomia de imprensa. Nela, publicou o primeiro personagem fixo do quadrinho nacional. O tom tragicômico de As Aventuras de Zé Caipora fez muito sucesso.
Popularização com O Tico-Tico
O Tico-Tico, primeira revista em quadrinhos do Brasil, voltada para o público infantojuvenil, foi lançada em 11 de outubro de 1905. A publicação vinha com passatempos e seguiu sem concorrentes por muitos anos.
Os responsáveis por O Tico-Tico eram o desenhista Renato de Castro e o jornalista Luís Bartolomeu de Souza e Silva. Angelo Agostini (olha ele aí de novo!) fez o letreiro e algumas histórias para a revista.
A base para o formato foi a revista infantil francesa La Semaine de Suzette, famosa pela criação de Bécassine, a primeira protagonista feminina das HQs.
Aliás, Bécassine apareceu em O Tico-Tico, porém, o nome foi traduzido como Felismina. Outros personagens que já eram consagrados lá fora também apareceram, como Gato Félix, Popeye, Mickey Mouse e Superman.
Foram autores nacionais de destaque: Luís Sá (Bolão, Reco-Reco, Azeitona), J. Carlos (Juquinha, Jujuba, Borboleta, Lamparina, Gury, Carrapicho, Cartola, Goiabada), Max Yantok (Kaximbown) e Alfredo Storni (Zé Macaco).
Adolfo Aizen, considerado pai do quadrinho nacional
Um grande salto na divulgação dos quadrinhos brasileiros ocorreu com A Gazetinha. O suplemento começou a vir junto do jornal A Gazeta em setembro de 1929.
Também havia o Suplemento Juvenil, de 1934, no jornal A Nação. Vinha no formato tabloide, semelhante aos suplementos dominicais que vinham nos jornais de Nova Iorque.
O responsável por trazer esse formato foi Adolfo Aizen, um soviético que vivia aqui e, ainda hoje, é considerado o pai dos quadrinhos brasileiros. Aizen veio com a proposta ao voltar de uma viagem aos Estados Unidos.
Ele apresentou a ideia para Roberto Marinho que, a princípio, recusou. Mais tarde, Marinho lançou sua própria versão. Como retaliação, Aizen criou O Lobinho, o que inviabilizou Marinho de lançar O Globinho.
Gibi, sinônimo de revista em quadrinhos
A partir da iniciativa de Aizen, várias publicações na mesma linha começaram a surgir em todo o país. No caso da que vinha com o jornal O Globo, teve que se chamar Globo Juvenil.
Mirim, de 1937, foi outra revista fundada por Aizen e a primeira no estilo comic book no Brasil. As histórias, que antes eram publicadas por capítulos nos suplementos, agora vinham completas.
A revista trazia muitos super-heróis pulp internacionais, como Tarzan, O Fantasma, Flash Gordon, Mandrake, Dick Tracy e O Sombra.
A propósito, você sabe como surgiu o termo “gibi”? Na época, essa era uma gíria que significava “menino” ou “moleque”. A revista Gibi começou a ser publicada em 1939 e foi mais uma resposta do Grupo Globo às revistas de Aizen.
Para garantir a hegemonia, Gibi fez um contrato de exclusividade com a King Features Syndicate e trouxe vários personagens da concorrência. Isso fez com que as tiragens semanais aumentassem de duas para três.
Quadrinho nacional no período Pré-Militar
Em 1942, as histórias de Amigo da Onça fizeram sucesso na revista O Cruzeiro. Nos anos 1950, a Editora Abril passou a adotar o formatinho. Aos poucos, esse se tornou o tamanho padrão das histórias em quadrinhos no Brasil.
Os personagens e temas mais voltados para a cultura brasileira começaram a surgir em 1961, em O Pererê. A revista, escrita e ilustrada por Ziraldo, costumava trazer temas de cunho educacional e ecológico.
Foi nessa época que começaram a surgir também os primeiros super-heróis nacionais. Entre os de maior sucesso estavam Escorpião, Raio Negro e Capitão 7.
Com o início do período militar, em 1964, as publicações passaram por décadas de censura moralista. Ao mesmo tempo, isso inspirou o crescimento das charges que criticavam o regime em jornais como O Pasquim.
A primeira revista da Turma da Mônica surgiu em 1970. Nem é preciso dizer que, até hoje, as publicações de Maurício de Souza batem de frente com a Disney, a Marvel, a DC e várias editoras de mangás.
Período Pós-Militar
O período militar acabou em 1985, e artistas como Angeli, Glauco e Laerte ajudaram a restabelecer o quadrinho nacional.
Nessa época, surgiram personagens como Rê Bordosa, Piratas do Tietê, Geraldão e Overman. Juntos, eles publicavam Los 3 Amigos, que satirizava os faroestes norte-americanos para tratar de temas típicos do Brasil.
O Menino Maluquinho, de Ziraldo, foi a volta do cartunista às publicações para o público infantil, depois de anos de perseguição militar. A revista, baseada no livro de sucesso de mesmo nome, durou de 1989 a 2007.
As décadas de 1980 e 1990 viram ainda uma grande quantidade de versões brasileiras. Além dos roteiros, as artes de Tio Patinhas, O Fantasma, Transformers, He-man, Chaves e Chapolin eram totalmente feitas no país.
Isso inclui de versões licenciadas a não oficiais. Até mesmo apresentadores de TV, humoristas e esportistas ganharam revistas próprias: Xuxa, Gugu, Faustão, Sérgio Mallandro, Angélica, Os Trapalhões, Ayrton Senna, entre outros.
Como as últimas décadas têm sido?
Com o tempo, o quadrinho nacional foi ganhando espaço em bienais do livro. Além disso, as próprias bienais dos quadrinhos contribuíram para a valorização dessa forma de linguagem.
Em 2010, os gêmeos Fábio Moon e Gabriel Bá tiveram o talento reconhecido internacionalmente pela série Daytripper. A coletânea Hinário Nacional, de Marcello Quintanilha concorreu ao prêmio Jabuti em 2016.
Ainda falando em premiações, os agraciados com o troféu HQ Mix, criado em 1989, ganham cada vez mais destaque. Os prêmios são entregues anualmente e o evento é o principal do segmento no Brasil.
Sucessos de bilheteria hollywoodianos transformaram o modo como o público mundial vê os quadrinhos. Eles passaram a ser vistos com mais seriedade enquanto forma de arte. Isso abriu caminho para novos temas e estilos.
O Brasil seguiu essa tendência, fazendo crescer o número de artistas dedicados ao gênero, boa parte deles independentes. As técnicas digitais possibilitaram obras que não ficam devendo em nada o que é feito lá fora.
E o resto é história…
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